sábado, setembro 29, 2007

O FOGO, A ARANHA E A MOSCA

A mosca a aranha à teia atraiu e à teia foi. Trouxe à teia a aranha a mosca. Pobrezinha! Será o fim que chegou? Mas não vacila, de muito à teia vir, a mosca ateia fogo à teia e a tudo até. Esquecendo-se entretanto a mosca que à teia atada estava ainda, e tão atada estava que fugir da teia não havia como. Aranha, mosca? Jé eram! Feito fogo, teia queimou aranha e mosca e incinerou-se. Queimaram-se. Inertes as cinzas das três atiradas num canto do piso escuro do mundo em chamas que, por pura falta de noção da mosca, por ora está chamejante.
As chamas chamejantes chamejavam e a chamar por aranha estavam. Chamavam pelo o ar, clamava por ar, mais ar, careciam do ar para poder respirar, queimar, incinerar, intoxicar. todas as labaredas, como lavas recém expelidas de um vulcão ativo em chama como a tua cama que me faz tremer, escorriam em direção aos céus, mais alto, muito alto, bem alto, consumiam todas folhas das árvores, da relva, as próprias árvores e quem mais desavisado ousasse se opor ao seu avanço. Vagarosamente, as labaredas avançavam, e eram tantas labaredas a vagarosamente avançar que repentinamente se expandiam. E não havia extintor que as extinguissem, bombeiros que as bombeassem ou águas que as esfriasse. O fogo era quente, intenso, alto e altivo. Ardia, de volúpia, languidamente, a paixão corava as faces de quem observava. O fogo a queimar a vida aos poucos, a intoxicar os pulmões aos tantos e aos montes subindo, trotando, cavalgando suas gramíneas prateadas. O vapor emanava da fogueira, fogos, fogos, fogões. O amor ao ar, é o fogo.
"De tanto amar e amar, o que em nós queimar, é o que nos vai podando. Amar é libertar, libertar-se das cinzas, até ficar o fogo, o seu trote frondoso, o fogo, o fogo ainda."
Citação entre aspas: Carlos Nejar
Assim Queimava Zaratustra

quarta-feira, setembro 26, 2007

O DESCOBRIMENTO

Tustra estava acostumado, quase todas as manhãs, a sentar-se em sua rede e ler seus livros mais diletos. Sem qualquer dúvida, hoje pela manhã ele encontrou um livro antigo e recordou-se que ainda não o havia lido. Então o olhou fixamente e o escolheu como a leitura do dia. Era a história da um homem que estava acostumado, quase todas as manhãs, a sentar-se em sua rede e ler seus livros mais diletos e que, sem dúvida, hoje pela manhã ele encontrou um livro antigo e recordou-se que ainda não o havia lido. Seu nome era Zaratustra.

Zaratustra leu tudo isso e fechou o livro já que depois de ler o primeiro parágrafo ficou trêmulo, fantasticamente absurdado. Todos os livros lidos ao longo de sua vida (a sua própria vida) passaram-lhe em dois minutos diante de seus olhos. Seus sentimentos eram os mais dúbios e incertos, mas em pouco tempo ele sentiu a grande felicidade de um maravilhoso descobrimento e também a tristeza decepcionante de descobrir-se um mero personagem literário.

E o pior, o fim do livro chegou.

Assim descobria Zaratustra

quinta-feira, setembro 20, 2007

REPETICÃO

O sol ilumina meu rosto com um vento frio em minha face. Minha alma enregela, treme, congela, sucumbe. O sussurro suave da tua voz ao meu ouvido soa doído. A música inunda num dilúvio sem alívio os meus ouvidos vida à fora assim como os inundam a fria ventania que me abraça a face. As roupas de cama jogadas sobre minha vida continuam arrumadas agora que a ventania me inunda a face. O vinho que brindaria nossas desesperanças não foi aberto como sempre: um sinal vermelho! Porém quando sussurras em meu ouvido eu não ligo para o sinal vermelho. Sigo. Viro à esquina sem importar-me com o sinal vazio. Prossigo pelo elevador do fundo do mundo lotado que rompe e nos interrompe e o ocaso ao acaso me atrai e me trai enquanto conduzo o carro e a ventania me abraça a face e me inunda de frio. Minha boca seca de tanto querer-te, de querer lamber-te, de querer sorver-te como sorvete, de tão embriagado que sou, de tão embriagado que fiquei, de tão...de tão...
Uma ressaca de vinho é o teu desejo e temor que se digladiam enquanto a fria ventania me tortura a face e varre o caminho que agora é o meu destino. E no fundo do seu vento como um instrumento violento, um sinal vermelho de corda que toca me toca e me acorda com acordes vermelhos e me conduz para um transe e me impele aos cacos dos caos, me leva à esgares. Um Instrumento. Um sinal vermelho. Um sinal vermelho que toca os acordes como Instrumento de corda em meus ouvidos acordes doloridos enquanto prossigo perdido para um Instrumento. Um sinal. um Instrumento. Uma ventania. Um acorde violento. Uma nostalgia da ventania que ainda me abraça a face de braços e abraços que me causa arrepio e entorpece o meu tato e me tira o contato, um mal trato. Uma ventania em meu ouvido. Um lençol. E pelos prédios da cidade suas camas vazias de lençóis vermelhos cobrem um sinal com um sussurro arredio. Lençóis arrumados dos prédios sombrios sob um Instrumento vermelho. E eu ouço um acorde vazio de um instrumento sombrio dos prédios vadios.
...Sinais, instrumentos vermelhos, vazios, vadios...arredios.
E o teu sussurro em meus ouvidos soa como um sinal arredio de um acorde cortante ou um eco reverberante, vadio, uma ventania ou uma canção de um Instrumento vermelho batendo em meus ouvidos doloridos, vazios.
Um Instrumento. Tu ouves uma voz soturna, sombria, noturna, mesquinha, taciturna, a minha. "You can live..." Uma ventania te canta, te engana, te encanta, te confunde "You can live your fantasy..." Uma ventania vadia me lambe a língua seca e tu percebes a minha saliva doída, a ventania...de um uivo vadio.
"You can live your fantasy without me"
E num rosto esquadrinhado ou num desenho quadrinizado ou um instrumento arredio de uma flauta desafinada há uma voz áspera que te causa arrepio, a minha. E com um esgar arredio de um olho vadio, sombrio pela falta da tua ventania, há uma voz áspera, vadia, sombria, coberta com lençóis dos prédios sombrios. A taças vazias dos prédios sombrios secam minha garganta vadia. Da minha garganta esquiva emana uma vós sombria como um instrumento arredio, uma voz irritante, um eco arrogante, um grito cortante, ou um falsete reverberante: Uma voz mesquinha, sombria, a minha.
E tu queres caminhar em direção ao teu rio... e tu foges em direção ao teu rio... e como uma ventania voas para teu rio. E como uma canção repetitiva, como um texto repetitivo que pede, repete, te pede, te canta, te impede, te engana e repete em tua mente que se encanta, se perde e me pede, não impede, te confunde, você cede, se ilude e ela martela como uma música arrogante, um carta chata, envolvente, nauseante, deprimente, irritante.
E o meu abismo profundo te observa igual a um pássaro e tu sem disso te aperceberes ao menos pulas em direção ao fundo do meu abismo profundo. Subjuga-te às profundidades obscuras e aos vales vadios e vazios de um abismo sombrio, sem fundo, numa queda infinita. E tu que queres fugir da minha vós e pressentes a minha força, a minha voz trêmula em teu pensamento, crês com a melhor das inocências que distante do meu mundo contaminável viverás feliz (e sombria).
Mas além, além do fundo, no fundo do mundo, há um outro lado, um outro mundo, o meu, uma voz soturna como um instrumento em teus pensamentos noturnos te interpela e ela martela os mesmos acordes que tu pensas poder apagar. E temes pensar em meu vinho. Um sinal verde e: ouves agora uma voz taciturna da minha garganta soturna, diurna. E temes ao lembrar-te dos nossos encontros e das nossas vidas trançadas, dos meus gemidos vadios e do meus do uivos doloridos dentro de ti.
A minha voz soturna te ameaça, te atrai para uma luta psicológica como uma sangrenta batalha medieval. Uma voz taciturna, mesquinha, a minha, que diz alegre embora infeliz:
"You can live your fantasy without me, But you'll never know how much I needed you"
Assim Repetia Zaratustra

quinta-feira, setembro 13, 2007

Zaratustra, o Chato

De volta ao meu blog, quero ser chato. Chato como Goethe. Como Bortolotto. Como Gilberto Barros. Como Galvão Bueno. Chato como ver um jornal decadente. Chato como ver o Paulo Marconde gritando. Chato como o próprio Paulo Marconde. Pois bem...

"Ser, antes da amargura"
Deste modo LOBÃO escreveu num de seus encartes do álbum A VIDA É DOCE. Mas não é do Lobão que eu quero falar, apesar de que o show gratuito dele aqui, que eu fui uma vez, foi o melhor show da minha vida. Melhor até que ENGENHEIROS DO HAWAII.

É isso mesmo. Engenheiros do Hawaii, ou Humberto Gessinger do Hawaii, já que ele quem dita tudo por aquelas bandas. Os mesmos que já cantaram "nossos sonhos são os mesmos há muito tempo / mas não há mais muito tempo pra sonhar" ou "a gente faz de tudo mas nada faz sentido / nem as luzes da cidade, nem o escuro de um abrigo" ou ainda "meu coração é um porta-aviões, perdido no mar esperando alguém pousar / meu coração é um porto sem endereço certo, é um deserto em pleno mar". "Tudo que ele sabia cabia no bolso da jaqueta (a vida quando não faz muito sentido cabe em qualquer lugar, e a minha tem sido assim, no bolso da jaqueta)". "Eu que não sei perder perdi o medo / da escuridão. Da escuridão..." Ou quando ele fala "pra ser sincero não espero de você mais do que educação / beijos sem paixão / crime sem castigo..." CRIME E CASTIGO - DOSTOIÉVSKI. Ou então "eu me sinto um estrangeiro / passageiro de algum trem / que não passa por aqui / que não passa de ilusão" O ESTRANGEIRO - ALBERT CAMUS. Pode ser numa frase aparentemente inútil: "Ando só nem sei porque / não me pergunte o que eu não sei / pergunte ao pó / desça ao porão..." PERGUNTE AO PÓ - JOHN FANTE. "Somos um exército, o exército de um homem só / um bando de vampiros que odeiam sangue" O EXÉRCITO DE UM HOMEM SÓ - MOACYR SCLIAR. "Com as luzes lá em cima o céu não seria rima, nem seria solução" MUNDO, MUNDO, VASTO MUNDO / SE EU ME CHAMASSE RAIMUNDO SERIA RIMA/ NÃO SERIA SOLUÇÃO / MUNDO, MUNDO, VASTO MUNDO / MAIS VASTO É MEU CORAÇÃO - DRUMMOND.

E LEGIÃO URBANA então? Eu nem começo se não me empolgo. Para quem não leu Assim Falou Zaratustra de Nietzsche e Fausto de Johan Wolfgang Von Goethe pode ouvir essa música, ele resume o primeiro com frases do segundo; coisas que se vê no livro como quando o Zaratustra diz que é um raio, um relâmpago, um trovão e o metal que atrai tudo isso, ou quando vc encontra no livro Fausto e na música a citação “Não me entrego sem lutar, tenho ainda coração, não aprendi a me render, que caia o inimigo então”, quando o diabo vinha roubar a alma de Fausto. A música LOVE SONG “mas rogarei a mi senhor que me mostre quem é el matador ou que m’ampare del’ melhor” Nuno Fernandes Torneol da época do Trovadorismo. Tem também Hig non (do not forsake me) “meio-dia elevado (não me abandone) versão erudita do clássico de Western, um faroeste chamado Matar ou Morrer... E a música Andréa Doria que narra o naufrágio de um amor semelhantemente a um naufrágio de um navio italiano de mesmo nome da música.

Entre várias outras citações, que eu talvez passasse a noite inteira recordando, se eu não estivesse tão velho, com tanto sono e minha memória não falhasse nesse momento. Isso é o que me prende às músicas deles, uma intertextualidade. A citação. Um tipo de homenagem a quem eles admiram. Uma mensagem que, quando se conhece a obra citada, mostra-nos algo diferente do que parece à primeira vista. A surpresa...


Do mesmo modo como BARÃO VERMELHO gravou, nos seus velhos e bons tempos (antes de puro êxtase, que é podre) Flores do Mal, título homônimo do livro de CHARLES BAUDELAIRE, essas bandas dos anos 80 eram muito boas.

E eu, que não sou uma banda, mas também nasci quase nos anos 80, também tenho algo de muito bom. Que ainda não sei o que é. Mas como minha mãezinha (que já descansa) sempre falou, eu acredito.

Assim também J.D. SALINGER e seu Holden Caulfield devem ter algo de bom. Assim como MARIO QUINTANA, que deve ter algo de ruim. Assim como PAULO COELHO, que tem seu lado positivo. Porque sempre é bom existir coisas negativas pra gente poder comparar (e ter certeza do porquê não gostar) com as positivas e dessa forma ter certeza de que as boas são boas mesmo.

Assim como MARION ZIMMER BRADLEY antecipou Harry Potter, Harry Potter ressuscitou Marion Z. Bradley. Coisas mercadológicas. Assim como Luís Fernando VERISSIMO nunca vai superar o pai. E nem ÉRICO Verissimo vai chegar aos pés do filho. Paradoxos da modernidade.

Por essas e outras que JÔ SOARES nunca fez dieta. Perderia a graça. E Faustinho contra Guguzão também seria de péssimo gosto. Isso me faz lembrar que, quando eu era pequeno, gostava de comer mel com maionese. E ainda gosto.

E NEIL YOUNG me disse uma vez: "burn off all the fog and let the sun through to the snow". (queime toda a névoa e deixe passar o sol através da neve)

E eu disse a ela: "Let me see your face again before I have to go". (Me deixe ver sua face novamente antes de eu tenha que ir)

"You know who you are, you are my sexy Christmas baby mine" (Você sabe quem é você, você é os meus Natais sensuais minha criança) Isso veio de MARK SANDMAN. Não o Sandman das histórias em quadrinhos. O Sandman da banda MORPHINE. O Sandman que já morreu, e que poucos conhecem. Sandman que disse: "why can´t love be blind? (por que não poder amar é ser cego?) Instead it´s just a blind man crying...( O inverso é um homem cego chorando" e também "Late last night I saw you in my living room / you seemed so close, but yet so cold / for a long time I thought you´d be coming back to me / those kind of thoughts can be so cruel. So cruel... / And I know you did it all...in spite of me...". (Ontem tarde da noite eu o vi em minha sala de estar / você parecia tão íntimo, mas ainda tão frio / por muito tempo eu pensei que você estaria voltando para mim/ e esses amáveis pensamentos podem ser tão crueis. Tão crueis... / E eu sei que você fez tudo...em despeito de mim....)”

E foi JULIO CORTÁZAR um dos maiores amigos de Jorge Luís BORGES. E Borges disse:
"Hay tanta soledad en ese oro.
La luna de las noches no es la luna
que vio el primer Adán. Los largos siglos
de la vigilia humana la han colmado
de antiguo llanto. Mírala. Es tu espejo."

E ERASMO DE ROTTERDAM foi um dos maiores amigos de THOMAS MORUS. E Erasmo quem disse:
"É uma grande extravagância querer fazer consistir a felicidade do homem na realidade das coisas, quando essa realidade depende exclusivamente da opinião que dela se tem. Tudo na vida é tão obscuro, tão diverso, tão oposto, que não podemos certificar-nos de nenhuma verdade."

E FRIEDRICH NIEZTSCHE foi um dos maiores amigos de Richard WAGNER. Porém deixou de sê-lo. Algumas amizades não resistem às forças de egos, do tempo, ou sei lá... onde?...lá. (essa foi podre) E foi Nietzsche, no livro Assim FALOU Zaratustra, quem disse:
"Saiam à luz todos os segredos do vosso íntimo, e quando os virdes expostos ao sol, rasgados e despedaçados, então ficará a vossa mentira também separada da vossa verdade."

E assim minha mentira despede-se de minha verdade.

Assim Despediu-se Zaratustra.